Comprou no site da loja, mas o produto é de outra empresa. Quem resolve quando dá problema?

Entenda os direitos do consumidor nos ‘marketplaces’

Raphaela Ribas09/01/2021 – 12:11 / Atualizado em 09/01/2021 – 16:24

RIO – A alta demanda por compras on-line durante a pandemia de Covid-19 deu um impulso extra à parceria entre redes varejistas e fornecedores locais nos chamados marketplaces. Neste arranjo, o site das grandes empresas abriga produtos de pequenas. A questão é que quando dá problema, o produto vem errado, com defeito ou nem chega.

A advogada Karla Braz de Assis, por exemplo, comprou um aspirador robô pelo site do Magalu de empresa parceira. A informação de que era um outro fornecedor estava clara, admite. Mas quando o produto apresentou defeito, Karla diz que se sentiu desassistida, pois foi o nome da rede que lhe deu confiança para a compra:

— O Magalu deu um código para devolução dos Correios e disse que a empresa parceira resolveria, mas ninguém entrou em contato. Tive que ir atrás. O Magalu então disse que, como o terceiro não havia se manifestado, assumiria a devolução e foi assim.

Segundo o Magalu, o primeiro passo é sempre pôr o cliente em contato com o parceiro. Caso o consumidor não fique satisfeito, a empresa busca resolver.

Segundo a economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Izis Ferreira, o marketplace se tornou solução para o problema de estoques encalhados de pequenas empresas e o nó na logística das grandes.

Nesta integração, diz Izis, as lojas de vizinhança podem usar uma âncora para entrar no mercado digital, usufruindo da expertise na publicidade. Já as grandes empresas recorrem a produtos mais próximos de onde o cliente fez o pedido, agilizando a entrega.

Deu problema? É de todos

A titular da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão do Ministério da Justiça, Juliana Domingues, e o advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Igor Marchetti, entretanto, esclarecem que a responsabilidade da venda via marketplace é tanto da loja âncora quanto da parceira que vende e do fabricante.

— É o que se chama de responsabilidade solidária. O cliente pode acionar qualquer um deles, e eles não podem se esquivar. Depois as empresas se acertam entre si — pontua Marchetti.

Ele explica que os prazos de reclamação por defeito em produtos adquiridos em marketplaces são os mesmos de uma compra on-line tradicional ou física: até 30 dias para itens não duráveis e 90 para duráveis, a partir da identificação do problema.

A empresa, por sua vez, tem 30 dias para consertar. Depois deste prazo, o cliente pode exigir a troca, o reembolso ou abatimento do valor na compra de outro produto. Custos, como frete, ficam a cargo do vendedor.

Vale lembrar que trocas de modelos, cor ou tamanho não são obrigatórias, variam com a política de cada fornecedor.

— É importante estar atento pois as condições de entrega e a políticas de troca das empresas parceiras nem sempre serão as mesmas da âncora. É muito comum o consumidor achar que está comprando do site da grande rede e não perceber que trata-se de outro lojista, com outras regras — alerta Renata Ruback, dirigente do Procon Carioca.

Sem obstáculo na troca

A experiência do personal trainer Marco Senges nesse modelo não foi positiva. Ele se queixa de que não só o prazo de entrega costuma ser diferente entre loja âncora e parceira, como o tempo de resposta em caso de problema:

— É difícil falar com o parceiro, às vezes, a empresa nem responde e já me decepcionei com a qualidade.

O borracheiro, Carlos Augusto de Oliveira Xavier, por sua vez, diz que já teve vários problemas e dificuldades no contato com as lojas parceiras, mas continua comprando nos marketplaces, justamente por acreditar que o site âncora lhe dará cobertura caso haja qualquer tipo de contratempo:

— Já tive até que recorrer ao Procon. Mas com uma loja âncora forte tenho a certeza de que serei ressarcido.

O empresário Cid Augusto Parris só percebeu que não tinha comprado do Shoptime quando recebeu e-mail informando que a churrasqueira adquirida dia 23 de dezembro, com promessa de entrega na última quarta-feira, não constava mais no estoque da loja parceira. A empresa perguntou se ele queria a troca do produto ou devolução do dinheiro:

— Quero o produto que havia sido anunciado como disponível para pronta entrega. Além de faltar clareza que não estava tratando com a Shoptime, agora não conseguimos falar com ninguém para uma solução, só robô.

O Shoptime disse ter entrado em contato com o cliente e, a pedido dele, providenciado o cancelamento.

Juliana diz que, quando o prazo não é respeitado, o cliente tem direito de exigir o cumprimento forçado da entrega, trocar por outro item ou cancelar e ser ressarcido.

Marchetti lembra que para compras digitais há ainda o direito de arrependimento:

— Ele garante ao consumidor a possibilidade de cancelar o negócio e devolver o item até sete dias após a entrega, com direito a ressarcimento integral, incluindo o frete.

O frete, aliás, é um capítulo à parte. Mesmo com a devolução resolvida, Karla teve que ir aos Correios deixar o aspirador defeituoso, um risco em meio à pandemia.

— Estava em isolamento quase total. Quando comprei, entregaram na portaria — queixa-se Karla.

Sem obstáculos na troca

Para o advogado do Idec, o ideal, neste período, é que as empresas façam a retirada para troca na casa do cliente:

— Não é uma obrigação. A empresa pede para ir nos Correios porque reduz o frete dela, mas o cliente já pagou por este frete e, às vezes, caro.

Marchetti destaca que para a compra on-line com retirada na loja, a cobrança de frete é indevida. E acrescenta:

— O direito de arrependimento também se aplica nas compras feitas on-line, mas nas quais os produtos são retirados em lojas físicas.

Juliana ressalta ainda que não se pode criar obstáculos para que o consumidor exerça o direito de troca ou arrependimento, como exigência de caixa original ou lacre:

— Com a grande quantidade de produtos que consumimos todos os dias, não é razoável exigir que o consumidor guarde as embalagens originais de todos.

https://oglobo.globo.com/economia/defesa-do-consumidor/comprou-no-site-da-loja-mas-produto-de-outra-empresa-quem-resolve-quando-da-problema-24831033

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Renata Ruback

Advogada especialista em Direito do Consumidor





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